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Jelena Kabić
Revisto por:
Jelena Kabić
Sobre o Autor
Especialista de jogo responsável. Para além da formação em Psicologia, fez voluntariado numa clínica de reabilitação, na qual trabalhou com jogadores patológicos. Actualmente, verifica todo o conteúdo publicado no Aposta Legal Portugal para garantir que jogas de forma saudável e responsável.
Escrito por
Eduardo Tomás
Sobre o Autor
Especialista no mercado de apostas legais em Portugal. Tudo começou graças ao interesse pelas apostas em futebol, em particular nas de total de golos, handicap e cantos. Actualmente, compara as odds, bónus e ferramentas das plataformas legais em solo nacional.
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Jogo Ilegal e Vício do Jogo: Um Problema Apenas em Portugal?

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Jogo Ilegal na Europa
Jogo Ilegal e Vício do Jogo: Um Problema Apenas em Portugal?

Em 2015, as apostas desportivas online passaram a ser legais em Portugal.

Desde aí, temos assistido a um grande crescimento do número de jogadores em sites autorizados, tal como já acontecia noutros países europeus.

No entanto, o mercado do jogo legal sofre desde sempre a concorrência desleal de casas sem licença.

Neste artigo, vamos mostrar-te:

  1. Como é que os números do jogo ilegal se comparam entre Portugal e outros países europeus;
  2. Alguns obstáculos ao desaparecimento do jogo ilegal, não só em Portugal, mas também em Espanha, França e Bélgica;
  3. Os desafios partilhados por estes países, seja a nível de bloqueio de sites ilegais ou do crescimento do número de auto-exclusões.

A análise destes números é um bom indicador da tendência do jogo nestes países, quer ao nível do jogo patológico, quer ao nível do jogo em casas ilegais.

Mas, antes disso, vamos mostrar-te o quão importante é o contributo das apostas desportivas online para os cofres do estado, nos mercados regulados português, espanhol, francês e belga.

No 4º trimestre de 2016, a receita bruta gerada pelas apostas desportivas legais era de 17.4 milhões de euros. Porém, no 4º trimestre de 2022, este valor viria a disparar para 85.5 milhões.

Os números anuais mostram a mesma tendência gradual de subida: se em 2021 a receita bruta para apostas online era de 252.1M €, em 2022 passava para 292.2M €.

Olhando para os dados de outro países europeus como Espanha e França, vemos que esta tendência é geral.

Receita Apostas Online 2022Receita Apostas Online 2021
Portugal297M €252M €
Espanha356M €306M €
França1 389M €1 355M €
Bélgica134M €

Os nossos vizinhos passaram de uma receita bruta de 305.88M € para 356.45M €, enquanto que por terras gaulesas a receita aumentou 34 milhões de euros.

Não existem ainda dados da Bélgica relativos à receita de 2022, mas em 2020 existiam 502 738 jogadores a apostar pelo menos uma vez por semana num site legal. Em 2021, o número passava para 576 493.

Apesar de a tendência ser geral, claro que houve dois acontecimentos chave que contribuíram:

  • O período de fecho das casas de jogo físico (devido ao COVID19);
  • O Mundial de 2022, o primeiro a ser disputado no final de um ano civil.

Segundo o site francês 20 minutes, a final França X Argentina gerou 55 milhões em apostas, face aos 37.5 milhões que os franceses haviam apostado no França X Croácia de 2018.

Final do campeonato do mundo entre frança e argentina

Como podes ver, esta é uma tendência que veio para ficar. Porém, há uma questão que paira no ar.

Uma vez mais, começamos por responder a esta pergunta olhando para Portugal.

Em 2023, existem apenas 8 operadores licenciados para apostas desportivas, havendo outros que já fizeram parte do mercado mas que, de momento, têm a licença suspensa a pedido.

Falamos de casas como a Betway, Nossa Aposta, ou Luckia, as quais continuam a apostar nos casinos online legais.

Operadores legais para apostas online
Portugal8
Espanha77
França17
Bélgica24

É um número muito reduzido – basta olhar para a Bélgica, um país com população muito similar (11,59 milhões de habitantes), que oferece 24.

Para além do número reduzido de sites de apostas legais, há ainda pouca variedade de tipo de apostas.

Em 2020, existiram casas com grandes quebras de facturação a clamar pela legalização das apostas em e-sports, por exemplo.

À primeira vista, faria sentido, visto que os esports não estão relacionados com as competições físicas tradicionais, algumas das quais foram suspensas ou adiadas.

A verdade é que, em 2023, as apostas em esports ainda não são legais em Portugal. Também não é possível apostar em eventos políticos ou mesmo em reality TV, como noutros países.

Tipos de Apostas LegaisApostas eSportsApostas em Eventos PolíticosApostas em Reality TV
PortugalNão NãoNão
EspanhaSimSimSim
FrançaSimNãoNão
BélgicaSimSimSim
Tipos de apostas legais por país

Na Bélgica e Espanha, por exemplo, é possível apostar em eventos políticos ou no vencedor da Eurovisão.

Há ainda a destacar a demora na regularização das apostas em crash em Portugal, jogo cuja promoção ilegal por parte de alguns influencers fez notícia em 2021.

O SRIJ anunciou em Novembro de 2021 que iria iniciar o processo de aprovação do crash, mas, quase dois anos depois, o processo ainda não está concluído.

Há outros factores importantes, mas num estudo de 2017 da Remote Gambling Association, 52% dos portugueses inquiridos justificava a escolha de sites ilegais com a oferta superior à do mercado regulado.

Estas são algumas das casas ilegais em Portugal nas quais os jogadores arriscaram jogar.

Consequentemente, o mesmo estudo mostrava que Portugal perdia 25 milhões em imposto sobre o jogo online anualmente, com apenas 39% do montante apostado a ir para o mercado regulado.

Em 2019, outra análise, desta feita pela Universidade Nova/Qdata, mostrava que 75% dos jogadores apostavam em plataformas ilegais.

Apesar de os números não serem totalmente comparáveis, indicam uma tendência clara: há cada vez mais dinheiro a entrar nos cofres do estado, mas também mais dinheiro a perder-se para casas sem autorização.

O jogo ilegal não é um problema exclusivo de Portugal, como ficou bem patente após a nossa recolha de dados e revista de imprensa. No entanto, os números mostram algumas diferenças.

Em Espanha, um estudo de 2022, feito pela Associação Espanhola do Jogo Digital (Jdigital), em parceria com a SigmaDos, mostrava que 53% jogavam indiscriminadamente em sites com ou sem licença.

Estes números fazem sentido, tendo em conta que 48.2% dos jogadores espanhóis não sabe diferenciar entre operadores legais e ilegais.

Em Portugal, sabemos que esta situação também se coloca, daí termos criado um artigo sobre como distinguir casas legais.

Na Bélgica, a comissão dos jogos de azar dava conta de jogo ilegal por um em cada cinco utilizadores em 2021. É um número que, embora preocupante, parece estar abaixo do que acontece nos países ibéricos.

Encontrar dados sobre as apostas online ilegais na França é mais difícil. Abrimos uma excepção e olhámos para dados em relação aos casinos online ilegais – na verdade, a lei francesa proíbe qualquer casino online.

Em 2021, era possível aceder a mais de 1000 casinos ilegais na França.

Uma amostra muito reduzida de alguns dos casinos online e URLs bloqueados na França.

Segundo um estudo de 2020 conduzido pela Harris Interactive, 13% dos jogadores online assumia ter jogado num destes sites antes da pandemia. É previsível que este número tenha subido após o período de isolamento.

Assim sendo, o número de sites bloqueados em 2022 em cada um destes países também não espanta.

Sites bloqueados a 31/12/2022
Portugal242
Espanha
França232 (números de 2021)
Bélgica416

Comparando os números de Portugal com a Bélgica, poderíamos assumir à 1ª vista que o regulador belga é mais eficaz.

Afinal de contas, num país com população semelhante, mas mais casas online legais, maior diversidade de apostas, bloqueou quase o dobro das plataformas ilegais.

No entanto, estes dados não chegam para confirmar esta teoria. O que parece evidente é que, com números piores ou melhores, nenhum dos reguladores tem poder para fechar estes sites sem recorrer à justiça.

Isabelle Falque-Pierrotin, presidente da ANJ (associação do jogo da França), assumia faltar “capacidade de bloqueio” administrativo, com o Tribunal Superior de Paris a conseguir tratar de apenas uma dúzia de casos a cada 2 meses.

Isabelle Falque Pierrotin, presidente da associação de jogo nacional da França

Em Março de 2022, a comissão do jogo belga assinou um acordo com o instituto belga dos serviços postais e telecomunicações para melhor lutar contra os sites ilegais.

A decisão foi motivada por problemas no bloqueio das plataformas ilegais, que não funcionava sempre ou poderia não funcionar em mobile, por exemplo.

Em Espanha, este não parecer ser o principal foco, mas não quer dizer que nuestros hermanos não estejam a tomar medidas em relação a outro problema: o vício do jogo.

Um dos mecanismos de que as casas de apostas legais dispõem dentro das ferramentas de jogo responsável são as auto-exclusões.

Em Portugal, este número tem subido e passou de 109 400 excluídos para 150 900 no final de 2022.

auto-exclusao de jogadores em Portugal

São números que preocupam, seja pela grandeza, seja por não contabilizarem jogadores de casas ilegais que deveriam utilizar a ferramentas, mas não a encontram nas plataformas sem regulação.

Esta é uma tendência comum aos outros países cujos dados analisámos, ainda que não os possamos comparar directamente:

  • Os de Espanha dizem respeito a 2020 e 2021, uma vez que os de 2022 não estavam disponíveis;
  • Os da Bélgica são separados de forma mais granular e dizem respeito apenas a auto-exclusões feitas pelo próprio, não por terceiros).
Auto-exclusões em 2022Auto-exclusões em 2021
Portugal150 900109 400
Espanha63 646 (em 2021)56 329 (em 2020)
França
Bélgica43 76239 279

Apesar de não termos dados concretos para o caso francês, o Le Parisien dava conta de 40 000 auto-excluídos a 12 de Janeiro de 2021. O mesmo jornal mencionava 400 000 jogadores patológicos.

Na Bélgica, os números mais fidedignos que encontramos datam já de 2017, mas mencionam entre 150 000 e 200 000 jogadores com problemas de jogo – preocupante, se compararmos o tamanho destas nações.

Apesar do número crescente de auto-exclusões, a verdade é que os números espanhóis estão muito abaixo daqueles de Portugal, sem levar ainda em conta a população 4X superior.

Os números parecem corroborar um estudo da Universidad Carlos III, de Madrid, no qual se conclui que a taxa de problemas de jogo naquele país é uma das mais baixas que existe (0.3%).

Por comparação, em 2019, a taxa de jogadores portugueses com vício do jogo era de 0.6%.

Existem algumas razões que podem ajudar a justificar esta diferença:

  • Maior número de sites legais de apostas disponíveis;
  • Maior oferta de apostas nos sites legais em Espanha;
  • Mentalidade de jogo mais virada para o entretenimento do que ganhos;

Para isto poderão também contar medidas de restrição à publicidade e de protecção de menores, que analizaremos noutro artigo.

Uma nota para o facto de estes 3 países ainda lidarem com estes problemas, apesar de terem legalizado o jogo online anos antes de Portugal. A França fê-lo em 2010, a Bélgica em 2011 e Espanha em 2012.

Apesar das diferenças no número de casas reguladas, tipos de jogo regulado ou mesmo tamanho da população, há algumas tendências comuns a Portugal, Espanha, França e Bélgica:

  • O aumento da receita das apostas desportivas;
  • Um número elevado de jogadores em sites ilegais;
  • Números de auto-exclusão em subida de ano para ano.

A subida na receita das apostas online desde a sua legalização não acontece só em Portugal – é um fenómeno que tem vindo a notar-se também em países como Espanha, França e Bélgica.

No entanto, nem todos os países vêem este crescimento acontecer da mesma forma. Dentro dos países europeus analisados, Portugal é o que tem menor oferta de sites de apostas legais e de tipos de apostas.

É sabido que o jogo ilegal em Portugal faz com que o estado deixe de arrecadar alguns milhões adicionais, mas também esta situação é partilhada com Espanha, França e Bélgica.

Não se pode dizer que o SRIJ não esteja a trabalhar, uma vez que, de acordo com dados recentes do 1º trimestre de 2023, notificou mais 72 sites para bloqueio

Seria possível ao SRIJ fazer ainda mais no combate ao jogo ilegal:

  1. Se tivesse poder executivo para fechar casas ilegais, em vez de participar ao Ministério Público?
  2. Caso permitisse o cash-out total, mais tipos de apostas e a homologação de novos jogos (como o crash) mais rapidamente?
  3. Atribuindo licenças às entidades que as pedem de forma mais rápida?

São questões às quais é difícil dar uma resposta concreta e às quais, como vimos, outros países europeus não são alheios.

Uma coisa é certa: o caminho para o combate ao jogo ilegal parece ser a criação de condições mais interessantes para as casas legais, o que também beneficia os jogadores.

Com isto, o jogo ilegal poderia ter mais dificuldades em competir, o que poderia ter efeitos benéficos para os cofres do estado, para quem joga por diversão e ainda para controlar o vício do jogo.

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